A cidade de Colônia, Colónia ou para os locais Köln, é a quarta cidade mais populosa de toda a Alemanha. Mesmo sendo uma cidade geograficamente pequena com seus pouco mais de 400 km², ou seja, menor do que as cidades de São Bernardo do Campo, Curitiba ou Maceió, tornou-se uma das minhas cidades favoritas no mundo todo.
Você pode agora estar pensando que sou exagerado ou que este se trata apenas de um artigo para atrair leitores. Como pode uma das cidades mais nubladas da Alemanha com apenas 1568 horas de sol em média por ano e com uma temperatura que fica entre 2ºC no inverno e 18,8ºC no verão ser um destino imperdível de férias?
Essa pergunta eu respondo com muita facilidade. Porque Colônia é como se fosse um livro de história que pode ser lido por quem anda pelas ruas da cidade.
Ué, mas toda cidade tem uma história para contar. Por quê ali seria diferente?
Isso é verdade! Já tivemos a oportunidade de visitar muitos destinos que contam suas histórias pela arte, arquitetura, língua e tantas outras formas que também podem ser conhecidas simplesmente caminhando pela cidade.
Acontece que Colônia é um daqueles pontinhos no mapa do mundo que parece ter nascido para ser destino de vários acontecimentos marcantes que aconteceram ao longo de vários séculos e que continuam a acontecer até hoje. Conhecer a cidade é como ter uma aula ao vivo sobre aqueles capítulos dos livros de história que estudamos nos tempos da escola.
Uma tribo germânica e o acordo com os Romanos
E o primeiro capítulo desse livro tem mais de dois mil anos, quando diversas tribos germânicas ocuparam a região onde hoje estão localizadas a Alemanha, Países Baixos e Bélgica.
Muito o que se sabe sobre essas tribos do período pré-romano é o que os próprios romanos escreveram sobre eles momentos depois. Apesar da ausência de registro escrito, sabe-se que foi no Séc. I a.C. que os Úbios, uma dessas tribos germânicas, cruzaram o Rio Reno em busca de terras seguras após serem expulsos pelos Suevos.
E foi cruzando o rio Reno que a primeira coincidência histórica aconteceu. As tropas de Júlio César, que se preparavam para uma invasão na Britânia, encontraram os Úbios ali estabelecidos pelo caminho. César, sabendo que esse encontro poderia ocupar e atrasar parte de suas tropas destinadas à invasão, ofereceu um acordo aos líderes Úbios. E foi compartilhando a posse daquelas terras e uma aliança militar contra os Suevos que nasce a cidade de Colônia.
Mas porquê Colônia?
A verdade é que a cidade só passou a ser chamada de Colônia algumas décadas depois deste acordo entre os romanos e os úbios. A pedido de Agripina, que se tornaria esposa do imperador romano Cláudio e que nasceu no então assentamento urbano Ópido dos Úbios, a cidade passou a se chamar Colonia Claudia Ara Agrippinensium ou Colonia Agrippina em homenagem a sua fundadora.
Pode parecer uma mera alteração de nome, mas a verdade é que a elevação daquela vila ao status de colônia tornava-a uma cidade sob a lei romana. A partir de então, diversos veteranos romanos se instalaram na cidade que passou a garantir privilégios aos seus habitantes. O desenvolvimento foi tamanho que não mais do que uma década depois, Colônia passou a ser a capital da Germânia Inferior. Uma província importante do Império Romano.
Mas então os Úbios passaram a ser romanos?
Mais do que isso. A cultura e a fidelidade às leis romanas se misturaram a tal ponto que os residentes passaram a se intitular orgulhosamente como agrippenses, em honra a sua fundadora. Aliás, Agripina, a Jovem, poderia ser com tranquilidade um personagem de Game of Thrones por tudo que tramou em vida e vale uma rápida pesquisa para quem gosta de história romana. Caso haja interesse de vocês, talvez eu possa preparar um post só sobre a história dessa personagem icônica e certamente uma das mulheres mais influentes de todos os tempos.
Um povo e vários líderes
Os próximos 4 séculos de Colônia seriam marcadas pela alternância de comando da cidade por vários povos diferentes. Após quase trezentos anos sendo administrada pelos romanos, um golpe de estado liderado por Póstumo em 260 d.C. separou algumas províncias romanas do controle do imperador, fazendo de Colônia a capital do Império das Gálias.
O Império das Gálias durou menos de duas décadas. Enfraquecida por diversas guerras e com uma administração fraca, foi capturada pelas tribos alamanas e logo depois recuperada pelos romanos.
Após mais cem anos de administração, por volta de 455 d.C. os romanos voltaram a perder o comando da cidade para os Francos. Iniciando assim o período em que Colônia foi administrada pelo Império Franco. Nesse meio tempo, por volta de 321 d.C., há também o primeiro registro da chegada dos judeus em Colônia formando o que dizem ser a comunidade judaica mais antiga dos Alpes.
A influência do Império Franco.
Mesmo que vagamente, eu tenho certeza que você se recorda de ter ao menos ouvido na escola sobre os Merovíngios e os Carolíngios. Pois é! Para Colônia, essas dinastias fizeram muita diferença.
Os francos, que dominaram uma vasta extensão de território europeu entre o final do Séc. V e começo do Séc. IX, governaram por mais de trezentos anos a então ex-colônia romana que já tinha sido governada por gauleses e foi fundada pelos Úbios.
Esse período trouxe grande influência ao povo de Colônia em diversos aspectos como língua, política entre outros tópicos. No entanto, talvez a maior dessas influências tenha sido religiosa. Foi Clóvis I, primeiro rei merovíngio, que adotou o cristianismo como religião oficial do seu império. Até aquele período, boa parte do seu império ainda era politeísta, ou seja, aclamavam vários deuses.
Vale dizer que essa conversão não era uma questão meramente espiritual, mas sim uma decisão política muito importante que definiu os próximos séculos da região. A aproximação com a igreja católica, com os súditos romanos e com os líderes germânicos que já adotavam o cristianismo há mais tempo garantiram o apoio necessário para a administração do império por um determinado período.
Com a deposição do último rei merovíngio e a ascensão de Pepino, o Breve e pai de Carlos Magno em 751 d.C. deu início à histórica dinastia dos Carolíngios. Essa nova dinastia trouxe uma prática comum aos germânicos que consistia em dividir o território do reinado entre os filhos do rei quando na sua morte ao invés apenas de passar tudo ao filho mais velho. Essa prática era impensável no Império Romano e foi mais um fato que mudou mais uma vez o destino daquela pequena Colônia.
Tratado de Verdun e o Sacro Império Romano-Germânico
A divisão do Império Carolíngio entre os três filhos do rei reorganizou todo o Império Franco e mudou o mapa da Europa. Claro que não sem antes muita picuinha, briga de egos e muita guerra.
A Frância Oriental ficou sob responsabilidade de Luís, o Germânico, que foi substituído por vários líderes carolíngios até a morte de Luís, a Criança, que foi o último carolíngio da parte oriental por volta de 911 d.C.. Na ausência de um herdeiro carolíngio, foram eleitos novos líderes até que Otão I foi eleito rei e, com seguidas vitórias em batalhas e acordos políticos através de casamentos e com a igreja católica, passou a ser o primeiro Imperador Romano do Sacro Império Romano-Germânico.
Claro que não era esse o nome que usaram em um primeiro momento, já que existia um Imperador Romano em Constantinopla e isso poderia não pegar muito bem. Mas esse título foi usado por todo o período do Império até a sua dissolução em 1806, quando o último imperador romano-germânico Francisco I abdicou do trono após sofrer uma derrota militar para os franceses comandados por ninguém menos que Napoleão Bonaparte.
Uau! Foram 1000 anos de Império Franco e Sacro Império Romano-Germânico influenciando a cidade de Colônia?
A resposta é sim em todos os aspectos que possa imaginar. Um dos pontos que mais gosto de destacar nesse período é a aproximação do catolicismo na região e como moldou a política desse período.
Inúmeros monastérios, igrejas e até mesmo a primeira catedral de Colônia começou a ser construída nesse meio tempo. Diversos bispos e futuramente arcebispos foram eleitos para ajudar a governar Colônia. Foi também nesse período que as ossadas dos três reis magos foram trazidas à cidade, colocando-a na rota da peregrinação católica.
Até mesmo o irmão mais novo de Otão I foi arcebispo de Colônia, sendo determinante em várias escolhas políticas da cidade naquele tempo. Só para ilustrar o alcance do poder de um arcebispo naquele período, cabia a ele a responsabilidade pela justiça criminal. Ou seja, determinar quem seria torturado ou mesmo executado em pena de morte era uma das suas atribuições.
O poder dos bispos em Colônia diminuiu um pouco a partir da Batalha de Worringen em 1288, quando Colônia, mesmo tendo perdido a batalha, ganhou independência dos arcebispos e tornou-se uma Cidade Imperial Livre.
Ao longo de todos esses séculos e utilizando até mesmo das antigas pontes romanas, Colônia foi membro de várias rotas comerciais entre o leste e oeste, bem como da principal rota comercial da Europa Ocidental. A cidade cresceu, lucrou e continuou a absorver tudo aquilo que vinha acontecendo à sua volta.
Mas e o Napoleão Bonaparte? Continuemos a história…
Napoleão esteve em Colônia com sua esposa Joséphine em 1804, dez anos depois da ocupação de Colônia e da região do Reno pelas tropas das Guerras Revolucionárias Francesas que se iniciaram na região em 1794.
Em 1798 Colônia passou a ser um arrondissement ou algo parecido com um distrito francês expandido pelas conquistas das guerras francesas. Já em 1801, todos os cidadãos de Colônia ganharam cidadania francesa e costumavam dizer que os franceses eram muito cavalheirescos e que não haviam cometido nenhum crime contra os colonos.
De qualquer forma, esse contexto não durou muito tempo. Em 1814 Colônia foi ocupada pelas tropas prussianas e russas, que expulsaram os franceses e passou a incorporar a cidade ao Reino da Prússia.
Opa…agora a cidade de Colônia teve tranquilidade?
Ainda não chegamos neste momento. O vasto reino da Prússia tinha grande interesse que os ducados e territórios germânicos fossem unidos em um grande processo de unificação territorial que levou ao surgimento da Alemanha como estado nação. Para tanto, guerras foram travadas na segunda metade do século XIX, onde a superioridade militar dos prussianos garantiu as derrotas dos franceses e austríacos.
Colônia e toda a Alemanha agora unificada passou a ser um Estado-nação que negociava e mantinha fortes alianças com a Prússia em detrimento das abaladas Áustria e França.
E as Grandes Guerras?
Na história mais recente, Colônia passou pela Primeira e Segunda Guerra Mundial. Durante a Primeira Guerra a cidade foi alvo de várias incursões menores, mas não chegou a sofrer danos significativos. A cidade foi ocupada pelos britânicos em 1926 e, talvez por sorte, os britânicos eram menos severos e mais indulgentes com a população local do que as ocupações francesas sofridas na Alemanha. Inclusive há registro do prefeito de Colônia que foi chanceler da Alemanha Ocidental posteriormente reconhecendo o impacto político positivo desta abordagem, principalmente porque os britânicos se opuseram as revanchistas demandas francesas que desejavam uma permanente ocupação aliada em toda a Renânia.
Já a Segunda Guerra teve um impacto muito maior à cidade. Se vocês se lembram no começo dessa matéria, eu disse que haviam registros de judeus na cidade desde 321 d.C. como a comunidade mais antiga dos Alpes. Também era em Colônia onde comunistas e social-democratas haviam surgido influenciados pela história da própria cidade e seus vários capítulos multiculturais. Em Colônia nunca houve, quando comparado à outras grandes cidades, um apoio decisivo aos nazistas.
Mas isso não fez diferença para o Partido Nazista e outros partidos de extrema-direita que tomaram a cidade e fizeram dela a sede de um Comando Militar responsável por toda a região. 11 mil judeus foram deportados ou mortos e as seis sinagogas da cidade foram destruídas. Os aliados jogaram quase 45 toneladas de bombas na cidade. 61% da sua área construída viraram ruínas de guerra e encontrei matérias que dizem que 91% das construções haviam sido bombardeadas e destruídas. A cidade foi evacuada e sua população reduzida em 95% do seu total ao final da guerra.
Em 1945, com o fim da guerra, o arquiteto e planejador urbano Rudolf Schawarz, que foi o responsável por desenhar um super plano de reconstrução em 1947, chamou Colônia de “a maior pilha de escombros do mundo”. Boa parte da arquitetura que vemos na cidade hoje é uma miscelânia de estilos e épocas diferentes. Tudo reflexo de uma cidade que precisava se erguer rápido e dar continuidade à sua história.
E hoje em dia?
Hoje em dia esse pequeno espaço geográfico que já foi uma vila de tribo germânica, colônia romana, capital da Germânia Inferior, capital do Império das Gálias, cidade dos Francos merovíngios e carolíngios, parte do Sacro Império Romano-Germânico, arrondissement da França, parte da Prússia e unificada dentro do Estado-nação Alemanha e que passou por tantas guerras, inclusive as Duas Grandes Guerras, continua escrevendo sua história.
Em cada canto da cidade podemos ter um vislumbre sobre algo dessa história e ao mesmo tempo nos conectar com a história que continua sendo escrita por quem ali mora. Apesar de tantas reviravoltas históricas e diferentes lideranças ao longo dos séculos, vale sempre lembrar que o povo era o mesmo do dia anterior. Quando chega o Império Franco, a população apenas troca de liderança, mas continua a mesma. Quando chegam os franceses, novamente só trocam as lideranças, mas o povo é o mesmo.
Por isso a população de Colônia é resultado da sua história e de tantas outras que para lá se mudam trazendo consigo sua bagagem cultural. Atualmente, mais de 36% dos residentes tem antecedentes de migração. É como se a cidade fosse tão rica em história que quer continuar contando a sua história e a de todos os outros que ela recebe de braços abertos. Não há como não querer conhecer Colônia e posso afirmar: o melhor jeito de se conhece Colônia é andando pelas históricas ruas da cidade!
Quer saber mais sobre a história de Colônia?
Se você planeja visitar a cidade de Colônia, saiba que sou responsável pelo tour chamado: Colônia Clássica free tour – Português. Trata-se de uma parceria com a Freewalk Cologne que é uma empresa de tours em Colônia super conhecida e muito bem avaliada no TripAdvisor.
Neste tour fazemos uma caminhada de aproximadamente 2 horas e meia enquanto conto algumas histórias, lendas e o jeito particular do povo de Colônia de viver. Abordarei sobre a origem da cidade e porque carrega esse nome não tão alemão. Visitaremos a famosa, sobrevivente e quinta maior catedral do mundo e sua surpreendente história de construção que levaram séculos para ser finalizada. Passaremos ainda pelas ruínas romanas de 2000 anos e um antigo portão romano da cidade velha que continua de pé até hoje. Além, é claro, de muitos outros pontos turísticos e outros não tão turísticos que vão te ajudar a entender melhor essa, que é a quarta maior cidade da Alemanha.
Tudo isso é apresentado de uma forma leve e com bom humor e feito por quem conhece a cidade de verdade. Para reservar seu lugar neste tour basta clicar aqui.
Passeios e tickets na cidade de Colônia
Se você gostou do nosso conteúdo e está pensando em passear por Colônia, fica aqui outra dica: GetYourGuide. Eles são a maior plataforma online do mundo para reserva de excursões e atrações turísticas. Clicando aqui você consegue reservar ingressos para as principais atrações de Colônia com antecedência, evita filas e ainda apoia nosso Blog sem qualquer custo adicional. Seguem algumas opções de passeios na cidade de Colônia e região:
O museu do Chocolate
A mundialmente conhecida marca de chocolate Lindt mantém às margens do Rio Reno um espaço dedicado à história do chocolate: o Schokoladenmuseum. Fiz um post exclusivo com as informações sobre esse museu.
Você pode fazer uma jornada por conta própria ou em visita guiada pelos mais de 4.000 m² de espaço que ajudam a contar a trajetória de mais de 5.000 anos da história do chocolate. São fatos históricos e recentes que passam desde a descoberta até os processos mais modernos de fabricação deste que é um dos produtos mais consumidos pelos alemães.
Ainda no mesmo passeio é possível acompanhar o funcionamento de uma pequena fábrica da Lindt que ali montaram. Os visitantes podem conferir de pertinho cada etapa do processo e finalizar experimentando o chocolate em uma fonte enorme. Qualquer lugar que tenha uma fonte grande de chocolate (com certeza) merece estar na minha lista de motivos para se conhecer uma cidade. Compre seu ticket aqui:
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Amoo Köln tenho minha família morando lá, sempre vou visitar. Cada retorno é um encanto sempre vou a cátedra de Dom agradecer por me levar de volta, a última vez dezembro de 2021🥰 Lu Zeferino Sou artista visual de São Paulo Br-luzrzeferino@yahoo.com.br
Olá Lu Zeferino : ) Podemos dizer então que você é uma pessoa de sorte. Poder visitar e revisitar o DOM tantas vezes é com certeza um um privilégio. Da próxima vez que estiver na cidade, venha fazer um tour com a gente : ). Abrss